Das quinze epístolas atribuídas a Inácio, oito são, por consenso universal, consideradas espúrias; e eruditos proeminentes têm questionado a genuinidade das sete restantes. Todavia, existem duas versões destas sete, uma longa e uma curta; e, enquanto há algumas dúvidas em relação à versão curta, a versão longa é, por consenso geral, atribuída a uma época posterior à de Inácio. Mas a epístola aos Magnésios, que existe tanto na verão longa quanto na curta, é aquela da qual os escritores do primeiro dia obtêm o testemunho de Inácio em favor do domingo, e citam para tanto, ambas as versões. Portanto, apresentaremos as duas. Apresentamos aqui a versão curta: SDS 29.5
Pois os divinos profetas viveram segundo a vida de Jesus Cristo. Por causa disso, eles foram também perseguidos, sendo inspirados por Sua graça a convencer plenamente os incrédulos de que há um só Deus, que Se manifestou por intermédio de Jesus Cristo, Seu Filho, o qual é o Sua Palavra eterna, não proveniente do silêncio, e que em todas as coisas agradou Àquele que O enviou. Portanto, se aqueles que foram criados na antiga dispensação, tomaram posse de uma nova esperança, não mais observando o sábado, mas vivendo na observância do dia do Senhor, no qual a nossa vida também é erguida novamente por Ele, a quem alguns negam e por intermédio da Sua morte –mistério este pelo qual obtivemos a fé, e, portanto, perseveramos, para que sejamos encontrados como discípulos de Jesus Cristo, nosso único mestre. — Como então seríamos capazes de viver separados Dele, cujos discípulos, sendo eles mesmos profetas, O aguardaram, pelo Espírito, como seu mestre? Assim, Aquele que eles devidamente esperaram, tendo chegado, os ressuscitou da morte. — Capítulos 8 e 9. SDS 29.6
Esse é o parágrafo do qual a parte de uma frase é citada para mostrar que Inácio testifica em favor da festa do dia do Senhor, ou sábado cristão. Mas o suposto dia do Senhor só é produzido por meio de uma falsa tradução. Esta é a decisiva sentença: meketi sabbatizontes, alla kata kuriaken zoen zontes; literalmente: “não mais sabatizando, mas vivendo de acordo com a vida do Senhor”. SDS 30.1
Proeminentes estudiosos do primeiro dia têm chamado a atenção para esse fato, e têm testificado explicitamente que o termo “dia do Senhor” não tem o direito de aparecer na tradução; pois o original não é kuriaken hemeran, dia do Senhor, mas kuriaken zoen, vida do Senhor. Isso é absolutamente decisivo, e mostra que algo comparado a uma fraude tem que ser usado a fim de se encontrar, nesta citação, uma referência ao suposto sábado cristão. SDS 30.2
Mas há um outro fato muito semelhante ao caso anterior. O escritor não estava falando dos vivos na época, mas dos antigos profetas. Isso é provado pelas palavras de abertura e conclusão da citação acima, que os escritores do primeiro dia sempre omitem. O suposto dia do Senhor é inserido por intermédio de uma tradução fraudulenta; e agora vejam o absurdo que surge disso. O escritor está falando dos profetas antigos. Portanto, se a festa do domingo for inserida nessa citação de Inácio, isso faz com que ele declare que “os divinos profetas” que “foram criados na antiga dispensação”, guardavam o primeiro dia e não guardavam o sábado? Ao passo que a verdade é simplesmente o oposto disso. Eles certamente guardavam o sábado, e não guardavam o primeiro dia da semana. O escritor fala do momento em que esses homens tomaram posse de “uma nova esperança”, que deve ser sua conversão individual a Deus. Eles certamente observavam e impunham o sábado após esse ato de conversão. Ver Isaías 56, 58; Jeremias 17; Ezequiel 20, 22 e 23. Mas eles também viviam, como esse escritor verdadeiramente afirma, segundo a vida do Senhor. O sentido do escritor acerca dos profetas deve, portanto, ser este: “Não mais [depois de sua conversão a Deus] observando o Sábado [meramente, como homens naturais] mas vivendo segundo a vida do Senhor”, ou “de acordo com Jesus Cristo”. SDS 30.3
Isso é demais para a versão curta da epístola aos Magnésios. Apesar da forma longa ser, quase por consenso universal de estudiosos e críticos, declarada como obra de alguns séculos depois da época de Inácio, ainda que uma porção dela seja frequentemente citada pelos escritores do primeiro dia para apoiar o domingo, e considerada também como as palavras de Inácio, nós aqui apresentamos, na íntegra a sua referência ao primeiro dia da semana e também ao sábado, o que eles geralmente omitem. Aqui estão suas declarações: SDS 31.1
Portanto, não guardemos mais o sábado segundo o modo judeu, alegrando-nos em dias de ócio; pois ‘aquele que não trabalha, que não coma’. Pois dizem os oráculos [sagrados]: ‘Do suor do teu rosto comerás o teu pão’. Mas que cada de um vocês guarde o sábado de maneira espiritual, alegrando-se na meditação da lei, não pelo relaxamento do corpo, mas admirando as obras de Deus, e não comendo coisas preparadas no dia anterior, nem tomando bebidas mornas, ou andando uma distância predeterminada, ou encontrando deleite em danças e aplausos que não têm o menor significado. E, após a observância do sábado, que cada amigo de Cristo guarde o dia do Senhor como uma festa, o dia da ressurreição, o rei e o principal de todos os dias [da semana]. Aguardando ansioso esse momento, o profeta declarou: ‘Tendo como fim o oitavo dia’, no qual nossa vida ressurgiu e a vitória sobre a morte foi obtida em Cristo, etc. — Capítulo 9. SDS 31.2
Essa epístola, apesar de ser a obra de uma mão posterior à de Inácio, é valiosa pela luz que lança sobre o estado das coisas quando foi escrita. Ela nos dá uma ideia do avanço da apostasia acerca do sábado durante a época do escritor. Ele fala contra a superstição judaica na observância do sábado, e condena os dias de ociosidade como contrários à declaração: “Do suor do rosto comerás o teu pão”. Mas, ao usar o termo “dias de ociosidade”, ele não pode estar se referindo ao sábado, pois isso seria fazer com que o quarto mandamento entre em conflito com esse texto, quando na verdade eles devem se harmonizar, visto que são contemporâneos da dispensação anterior. Além disso, embora o sábado seja um dia de abstenção do trabalho, não é um dia de ociosidade, mas de participação ativa nos serviços religiosos. Ele ordena sua observância de um modo espiritual. E, após o sábado ter sido assim observado, “que todo o amigo de Cristo observe o dia do Senhor como uma festa, o dia da ressurreição, a rainha e comandante de todos os outros dias”. A instituição divina do sábado ainda não tinha sido anulada, mas a instituição humana do domingo tornara-se igual a ela, e era até exaltada acima dela. Não muito depois disso, ela tomou todo o terreno, e a observância do sábado foi denunciada como herege e perniciosa. SDS 32.1
A renomada epístola de Inácio aos Tralianos, em sua versão curta, não faz alusão a esse assunto. No entanto, na sua versão longa, a qual admite-se ser obra de uma era posterior à de Inácio, as seguintes expressões são encontradas: SDS 32.2
Durante o sábado, ele permaneceu embaixo da terra; SDS 33.1
ao amanhecer o dia do Senhor, Ele ressurgiu dos mortos; SDS 33.2
o sábado engloba o sepultamento; SDS 33.3
o dia do Senhor contém a ressurreição. — Cap. 9. SDS 33.4
Na epístola aos Filipenses, que é universalmente reconhecida como sendo a obra de alguém posterior a Inácio, é dito o seguinte: SDS 33.5
Se alguém jejua no dia do Senhor, ou no sábado, exceto no sábado Pascal, torna-se um assassino de Cristo. — Cap. 13. SDS 33.6
Terminamos agora de apresentar todas as alusões ao sábado e ao primeiro dia que podem ser encontradas em qualquer escrito atribuído a Inácio. Vimos que o termo “dia do Senhor” não é encontrado em nenhuma frase escrita por ele. O primeiro dia nunca é chamado de sábado cristão, nem mesmo nos escritos falsamente atribuídos a ele; nem existe, em nenhum deles, nenhuma insinuação da doutrina moderna da mudança do Sábado. Apesar de falsamente atribuídas a Inácio, e escritas, na realidade, em uma era posterior, elas são valiosas por marcar o avanço da apostasia no estabelecimento da festa do domingo. Além disso, elas fornecem evidência conclusiva de que o antigo sábado foi mantido por séculos na suposta igreja católica, e que a festa do domingo foi uma instituição inteiramente distinta do sábado do quarto mandamento. SDS 33.7